A potiguar Cristiane Alexandre viralizou nas redes sociais após o cantor Zé Felipe publicar um vídeo rindo dela. Nas imagens, ela desabafava sobre comer 12 pães no café da manhã. O artista logo foi acusado de gordofobia por muitos internautas. O termo utilizado na internet para classificar praticantes de “bullying virtual” é “hater”, uma palavra de origem inglesa que significa “odiador”, na tradução literal para a língua portuguesa.
Assim como Cristiane, quem navega no mundo virtual está vulnerável a ataques virtuais. Em alguns casos, a pressão pode ser tão grande ao ponto de levar a vítima a considerar a morte como uma forma de alívio para essa dor. Mas como ajudar vítimas de ataques on-line? A psicóloga especialista em luto do cemitério, crematório e funerária Morada da Paz, Beatriz Mendes, elege o acolhimento como ação mais adequada para ajudar as vítimas. “A palavra-chave é ‘acolher’, no lugar de ‘julgar'”, destaca.
Beatriz coloca que é importante compreender que o mundo virtual resume-se a uma parcela da nossa existência. “Assim, podemos abrir espaço para diálogo sobre isso no mundo real, com pessoas de confiança para que medidas sejam tomadas. É preciso contar com pessoas reais para a preservação da saúde mental, pois, muitas vezes, tomamos o virtual como representação da perfeição, o que se constitui um perigo”, ressalta.
Uma pesquisa da Royal Society for Public Health (RSPH), instituição de saúde pública do Reino Unido, em parceria com o Movimento de Saúde Jovem, indicou que as redes sociais podem trazer benefícios ou malefícios à saúde, dependendo de como são usadas. A mídia social tem sido descrita como mais viciante do que cigarros e álcool, e agora está tão arraigada à vida dos jovens que não é mais possível ignorá-la.
A psicóloga especialista em luto do Morada da Paz ratifica os resultados do estudo, ressaltando que a internet por si só não se mostra perigosa. No entanto, o modo como navegamos nela se revela a chave para pensarmos uma infinidade de questões.
Beatriz cita que a articulação com o ciberespaço modifica a experiência da nossa possibilidade de expressão, do alcance de reflexões. “Isso pode ter efeitos muito positivos. Porém, quando algumas pessoas atrelam a liberdade ao contexto de irresponsabilidade e falta de limites diante da existência do outro, da coletividade, vivenciamos fortes perigos”, diz.
Crianças e adolescentes estão mais vulneráveis
Estabelecer filtros e transitar de maneira saudável nas redes não se revela fácil para os adultos; para crianças e adolescentes, isso é ainda mais desafiador. Segundo o Instituto de Pesquisa Ipsos, o Brasil é o 2º país com mais casos de cyberbullying contra crianças e adolescentes. Em Natal, o estudante Lucas Santos, de 16 anos, tirou a própria vida, em agosto deste ano, após ser vítima de comentários homofóbicos nas redes sociais.
Ele era filho da cantora Walkyria Santos, a qual revelou que o jovem vinha sofrendo ataques nas redes sociais após publicar um vídeo no TikTok. Em vídeo publicado em uma rede social que ganhou destaque midiático, Walkyria lamentou o “ódio destilado na internet” e disse que precisava deixar um sinal de alerta para outras famílias.
O Rio Grande do Norte sancionou, em setembro, uma lei para a inclusão de medidas de conscientização, prevenção e combate à depressão, à automutilação e ao suicídio. A lei, denominada Lucas Santos, tem como foco também combater o cyberbullying entre os jovens.
Cancelamento
Manter uma conta ativa nas redes sociais pode ser tóxico, uma vez que, eventualmente, a cultura do cancelamento e os “haters” também frequentam o ambiente virtual. Figuras públicas são constantemente alvos daqueles que propagam ódio na internet.
A cantora Luísa Sonza, por exemplo, após ser vítima de ataques, decidiu se afastar das redes sociais por um período. As agressões em série foram despertadas pelo divórcio de Whindersson Nunes, mas foram agravadas após tornar público o novo relacionamento, com o também cantor Vitão, e pela morte do filho de seu ex-marido. Com o intuito de preservar a saúde mental, Luísa passou um tempo nos Estados Unidos para cuidar da saúde mental, retornando às redes sociais apenas para anunciar um novo álbum.
Além da cantora, outros famosos já deram um tempo nas redes sociais. Entre eles, pode-se destacar o próprio Whindersson, Kéfera, Selena Gomez, Justin Bieber, Demi Lovato e Bruna Marquezine.
Cuidados
Para lidar com essas situações, Beatriz aconselha a busca da ética, do cuidado individual, o qual não pode abandonar a responsabilidade coletiva. “Diante de um discurso de ódio, mostra-se fundamental a consciência de compreender como ele nos afeta, como também pode afetar outras pessoas. É preciso ter em mente que os impactos naqueles que são alvos de tais apontamentos são inimagináveis. O uso está em nossas mãos, assim como os filtros e os acessos”, continua.
A psicóloga ressalta a importância da sabedoria para transitar nesse campo com cuidado e ética, sempre pensando na nossa responsabilidade de não repassar informações ardilosas, além de denunciar os conteúdos impróprios.
Ela também destaca a necessidade de compreender que o mundo virtual perpassa pelo modo como transitamos neste mundo real. Como isso nos afeta? Para a psicóloga, é inegável o quanto de amizades, trabalhos e informações demandam nosso acesso ao mundo virtual, mas, ainda assim, essa medida e ponderação não será feita por ele, e, sim, sempre por nossa construção e consciência das necessidades em relação a esse universo e quais são os impactos em cada um.
Caso seja difícil construir essa conscientização, ela enfatiza a relevância de buscar ajuda profissional para avaliar e refletir sobre os usos e repercussões no mundo virtual na vida de cada um.
IDÉIA COMUNICAÇÃO